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do Canal

 

Património Baleeiro e Património do Canal

 

Embora ausente da ilha durante as últimas duas semanas, não deixo nunca de acompanhar o dia-a-dia da nossa Terra, tanto quanto possível. E é esse interesse que me leva a apreciar, mesmo à distância, a vida parlamentar em períodos legislativos e a actuação dos nossos representantes políticos locais, como aconteceu no último período legislativo de Junho. Sendo impossível dar nota de tudo, retive duas abordagens de muito interesse. A intervenção parlamentar em “declaração política” do Deputado Aníbal Pires em relação aos navios da Transmaçor, questionando as medidas que “está o Governo a preparar em termos da sua substituição, substituição que, a prazo, será inevitável.” Adiantando contudo que, tendo defendido “no passado, como correcta a opção do Governo Regional de encetar um processo com vista à aquisição de navios para garantir o transporte público inter-ilhas (…) uma opinião que hoje reafirma”, pergunta ainda: “O Governo Regional já iniciou um novo processo de aquisição de navios? Está disposto a fazê-lo? E em que moldes?” E conclui: “ É isto que os açorianos querem, sobretudo, saber. Até porque, também, novos problemas se juntam aos já conhecidos, como é o caso do envelhecimento das embarcações que garantem o transporte entre as ilhas do Triângulo.”

Cruzeiro do Canal entrando na Baía da horta

Já noutro sentido e não menos importante, foi a do deputado Jaime Jorge ao referir-se ao “esquecimento” a que está votado o denominado “património do canal”. Embora a referência histórica das ligações marítimas entre o Faial e Pico não seja tratada de modo muito rigoroso, já que não menciona as lanchas das Lajes: Hermínia e Lurdes que semanalmente, durante décadas, percorriam a costa sul, desde as Lajes até à Horta, escalando vários portos, como o das Ribeiras, da Calheta de Nesquim, de São João ou São Mateus e regressando ao fim do dia…, mas deixando este pequeno informe, concordamos inteiramente com o levantar do problema, mas não muito com a solução deixada no ar... É que, sendo real a explanação do deputado Jaime Jorge quando refere: “ (…) a necessidade de um olhar mais atento ao património que nos ficou dessa época, (…) único e exclusivo das ligações diárias, que este mesmo permitiu estabelecer e consolidar, entre as ilhas do Faial e do Pico. Por tudo aquilo que este património representou, neste modelo de vida que se foi gradualmente organizando neste canal, que une estas duas ilhas, que ainda faz parte da nossa memória colectiva mas que rapidamente tende a desaparecer; a sua manutenção e preservação, com vista a outro tipo de reutilização, é também, uma manifestação superior de cultura, porque é prova e atesta o grau de respeito e consideração que temos, pela nossa identidade enquanto povo ilhéu e por tudo aquilo que foi a saga da nossa sobrevivência. Este património, consiste nas lanchas de transporte de passageiros, que durante muitos anos sulcaram as águas deste canal, tais como a Maria  Lígia, a Calheta, a Velas e a Espalamaca e nos barcos cargueiros de cabotagem, de boca aberta, de transporte de mercadorias (…)“. Preconiza por fim uma idêntica preservação como a boa medida tomada quanto ao património baleeiro “que encontrando-se quase perdido, foi em boa hora, através de Decreto Legislativo Regional, passível de uma bem sucedida recuperação, encontrando-se hoje satisfatória e eficazmente preservado, para nosso deleite e das próximas gerações. (…) Assim poderia e deveria também este Governo, proceder em relação ao património do canal.” Fim de citação.

Calheta, Espalamaca e Velas na Horta

Ora acontece que não foi o governo que tomou a tal iniciativa de preservar o património baleeiro, mas sim o parlamento e com modéstia refiro que, enquanto deputado, fui um dos subscritores dessa proposta que apresentámos à comunicação social, com a dignidade conferida pela sala do Museu dos Baleeiros que alberga o genuíno bote “Ester” (oferecido pelas Armações Baleeiras Lajenses) e lá patente em exposição permanente atestando essa saga baleeira picoense. Proposta que originou o Decreto Legislativo Regional nº. 13/98/A, aprovado no parlamento açoriano em 18 de Junho de 1998, presidido pelo Presidente da ALRA, Dionísio de Sousa e assinado em 17 de Julho pelo Ministro da República, Sampaio da Nóvoa, que depois foi regulamentado pelo Decreto Regulamentar Regional nº 24/2000/A de 7 de Setembro, que havia sido aprovado em 25 de Julho de 2000 em Conselho de Governo presidido por Carlos César e assinado em Angra, em 22 de Agosto pelo Ministro da República, Sampaio da Nóvoa. Nesse dia proferi a intervenção inicial de apresentação do diploma do que vos deixo alguns excertos: “ (…) Sras. e Srs. Deputados, em 23 de Março de 1993, nesta Casa-Mãe da Autonomia Açoriana, abordei este tema, chamando a atenção para a grande injustiça que se praticava, por omissão, em relação à não aquisição pelo Governo Regional, do património das Sociedades/Armações Baleeiras do sul do Pico, já que havia adquirido todo o património das Armações Baleeiras Reunidas de S. Roque do Pico. Enfim... Registos que hoje são história,  Srs. Deputados e que nos devem fazer meditar naquilo que, para nós, constituirá sempre um eterno dilema: Talvez muito do nosso património baleeiro não tivesse sido desbaratado e infelizmente vendido para o estrangeiro  se, pela via legislativa, tivessem sido definidas as regras de transferência desse espólio, dentro e para fora da Região, e ou a sua alienação.

Bote Baleeiro do Capelo - Faial

Que nos sirva de lição para o futuro. Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, Sr. Secretário Regional: Como co-autores desta iniciativa legislativa, queremos registar as importantes e judiciosas considerações e contributos recebidos de personalidades identificadas com esta temática como João Afonso, Ermelindo Ávila, Francisco Medeiros, António Manuel Machado e Prof. Moniz Bettencourt, meu mestre de escola, de quem me permite fazer uma breve, mas sentida referência, do comentário simpático que nos enviou — cito: Felicito os proponentes pelo merecimento e pela necessidade de há muito, de semelhante iniciativa. Dou o meu inteiro acordo ao projecto em apreço por não reconhecer, sobretudo, a merecida homenagem que já tardava a quem tanto se deve a inteligência e espírito de sacrifício e perseverança. (…) Igualmente agradecemos penhoradamente os importantes contributos recebidos da Instituição Museológica da Ilha das Flores e das diversas autarquias da Região que de algum modo têm afinidades culturais com este tema. Relevamos por último algumas das propostas do Departamento de Oceanografia e Pescas, com a sua inovadora sugestão de alargamento do âmbito de concessão de bolsas de estudo, para a investigação sobre biologia e conservação de cetáceos em águas açorianas e, principalmente, do Prof. Rui Martins, do Centro de Estudos Etnológicos da Universidade dos Açores. Com a aprovação deste diploma, que contou com a colaboração empenhada de toda a Comissão, salvaguarda-se a classificação de todo o património baleeiro e garante-se a igualdade de acesso futuro a todas as entidades interessadas nos apoios financeiros, através da definição de critérios objectivos para as respectivas candidaturas. Este diploma dignifica este Parlamento e renova, de algum modo, o  respeito dos cidadãos, pela nobre missão  de legislar quando estão  em causa os superiores interesses do nosso povo. Disse”
Aqui chegados, julgo não me falhar a memória se disser que a edilidade da Madalena andou interessada em criar um espaço museológico sobre o Património do Canal, não sei se foram dados já alguns passos, mas será mais avisado caminhar pela via legislativa e nesse sentido é tempo de o parlamento, em iniciativa própria, fazer vingar os argumentos do deputado Jaime Jorge, porque depois de aprovado o Decreto Legislativo, caberá então ao Governo a sua regulamentação e execução, como acima explanei.
É só um modesto alvitre ou apenas simples e modesta sugestão…

 

  

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